Preso e solto em Salamanca
Escrito pelo Esc. Lucas Pedro dos Santos
Na autobiografia de Santo Inácio de Loyola, no trecho situado logo após os estudos que Inácio realizou em Barcelona e Alcalá, destaca-se o tempo em que ele foi preso pela inquisição. Sua prisão teve como objetivo analisar as inspirações de seu ministério em relação aos Exercícios Espirituais e demais pregações, para ver se o que ele ensinava não entrava em desacordo com a doutrina da Igreja. Sem encontrar incoerências em suas pregações, os inquisidores lhe recomendam a continuar os estudos. Para isso, o peregrino segue o seu caminho em direção a Paris.
Chegando em Salamanca, Inácio tem uma profunda experiência de oração, que o faz ver a si mesmo e outros quatro amigos que, mais tarde, afetivamente, foram sendo reconhecidos e chamados companheiros, inspirados pela experiência singular na caminhada de Iñigo de Loyola em sua oração de se perceber devotamente como “Companhia”.
Mas, de fato, o que significa ser Companhia? Vem a ser aquele que parte o pão comum com o outro, aquele que divide o mesmo caminho, missão com o outro. Daí o sentido forte para a Companhia de Jesus de estar alicerçada sobre uma forte experiência de oração individual que visa perceber por onde Deus move a sua criatura na busca pela vontade do Criador, ao mesmo tempo, assume uma característica comum partilhada e assumida por outros. E daí vivida em comunidade.
Nessa passagem da autobiografia é visto como as pessoas são movidas pela curiosidade e o interesse para saber como esses “Companheiros vivem”, como eles são movidos e a partir do que são inspirados. Os Frades de São Domingos, encantados com esse modo de proceder da nascente Companhia de Jesus, lhes pedem para que os ensine a ensinar da mesma maneira, seguindo os mesmos passos que aparecem nos Exercícios Espirituais.
Inácio, com sua humilde partilha com aquela comunidade, admitia que possuía poucas letras e pouco fundamento sobre as coisas sagradas. Desse modo, ele deixa transparecer a simplicidade do seu relacionamento com o Senhor, o que ao mesmo tempo demonstra ser um desvelamento do sublime sentimento gracioso e belo de um ser humano, que deixa Deus ser Deus e a criatura ser criatura, bem-amada e querida. Reconhece que todo o amor que o move desce do alto e o faz escolher.
Seguindo assim a inspiração inaciana do se colocar diante do Senhor em Oração para discernir a vontade de Deus, seguindo de uma partilha do vivido em comunidade, fazendo que o sentido de Ser Companhia encontre na comunidade o sentimento partilhado de uma experiência individual que se complementa no plural. Portanto, comer juntos do mesmo pão é reconhecer que uma missão comum nasce de experiências individuais que são postas em comunidade. Pelo discernimento comunitário a missão é levada à sua realização por companheiros que possuem um mesmo modo de proceder.
Hoje essa inspiração se eterniza nas palavras do Papa Paulo VI, em dezembro de 1974: “Onde quer que, na Igreja, mesmo nos campos mais difíceis e de primeira linha, nas encruzilhadas das ideologias e das trincheiras sociais, houve confrontações entre as exigências urgentes do homem e a mensagem permanente do Evangelho, ali estiveram os Jesuítas”. Que este exemplo de vida e oração seja fonte de inspiração para prosseguir o caminho, sempre em busca daquilo que mais nos conduz para a maior glória de Deus e bem das almas. Que o Senhor nos dê a graça de sempre buscar aquilo que mais nos conduz para o fim ao qual fomos criados.
Textos bíblicos: Mt 14, 13-21 e Jo 13, 1-15
Pista de reflexão: onde contemplo no caminho experiências de ser companhia de si e do outro, comungando do mesmo pão como experiência de comunhão e unidade?