Centro Loyola de Fé

O AMOR

Eguimar Felício Chaveiro
[Doutor em Geografia Humana – Livre-docente da UFG/Universidade Federal de Goiás]

Quando fazia o segundo grau em Trindade-Go, eu tinha um amigo do peito: José de Souza.
Além de sua bondade e de seus atos solidários, ele era também um parceiro de interrogação.
Depois das aulas de física (que eu amava), saíamos para as nossas casas falando sobre a velocidade da luz
e da sombra; sobre a relação entre a claridade e as retinas. O universo era o nosso amigo de caminhada.
Voltávamos para as nossas casas embalados por um papo sideral.
Tecíamos na caminhada celestial ideias adolescentes:
perguntávamos se não existisse a luz e se mesmo sem luz fosse possível haver vida,
o que o ser humano teria nos lugares dos olhos.
Perguntávamos se haveria o desenvolvimento ao máximo da escuta e do tato.
Perguntávamos se, vivendo no breu infinito, a imaginação poderia dar os seus maiores saltos.
Perguntávamos. Perguntávamos…
Um dia, subindo a rua entusiasmados com os segredos do universo, observamos um vira-lata.
Sem pose e sem pudor, certamente ausente da física teórica e dos badulaques do firmamento,
o cãozinho mijava feliz no poste de luz. A sombra da noite guarnecia o seu ato físico
exercido com liberdade e satisfação. À distância, víamos, eu e o meu amigo,
uma fotografia em silhueta do cãozinho anônimo. Na cena havia rara beleza.
Sob a ilusão de ótica, observando o cãozinho urinar, experimentávamos uma fruição estética estranha:
contemplávamos um vira-lata no mesmo momento que fazíamos interrogações físicas.
Ali, fui aprender depois, se sacramentava um ponto central da teoria estética:
ver é sempre um atributo do coração. Ver é sempre um atributo filosófico.
Ademais, sentir é o noves-fora da experiência de viver.
Alegre com o mijo libertador e desavisado do mundo, o cãozinho contornou a tarefa orgânica
e nos seguiu lento como um poeta paisano. Sob o ritmo dos nossos passos, ia Ele como um irmão noturno.
De repente cessaram as nossas perguntas de física, só havia espaço para o amor.

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