Centro Loyola de Fé

Espiritualidade do encantamento

“Ao ver uma planta, uma pequena erva, uma flor, uma fruta, um pequeno verme ou qualquer outro animal, Santo Inácio contemplava e levantava os olhos aos céus, penetrando no mais interior e no mais remoto dos sentidos” (P. Ribadeneira)

Para a pessoa que passou pela experiência dos Exercícios Espirituais, cada criatura torna-se uma irradiação de Deus, um lampejo do Absoluto, um recipiente onde se conservam gotas de transcendência. Cada vida, seja animal ou vegetal, é um cenário de manifestação de Deus. As criaturas são o habitat de Deus. Tudo fala de Deus, tudo manifesta e revela o seu Amor. Tudo pode ser lugar de encontro com Deus, tudo é sacramento de Deus (Deus nos fala a linguagem das coisas, das criaturas, dos acontecimentos, da festa). Tudo pode causar admiração e encantamento.   Como não se extasiar diante da majestade da Criação?

Para Inácio, tudo está amorizado, ou seja, cheio de Amor, tudo está cristificado e cheio de sentido. O cosmos abria para ele um espaço de totalidade, onde a graça de Deus, depois de consolá-lo, enchia sua existência de um desejo sempre maior de servir a Deus e ao próximo. “A maior consolação que descobrira então era contemplar o céu e as estrelas. Fazia-o muitas vezes e por muito tempo, porque com isto sentia em si um muito grande esforço para servir a Nosso Senhor” (Aut. 11).

Santo Inácio vê uma bondade intrínseca em todas as manifestações do mundo visível. Para ele, não existe um dualismo entre homem e natureza, pois tudo é pensado e sentido globalmente a partir de Deus. A originalidade de Inácio está em enxergar a Criação a partir de Deus, “com os olhos do Amor”. A partir de Deus, o ser humano encontra seu lugar e sua relação com a natureza. Respeitando a singularidade de cada criatura e de seu estado vegetativo, sensitivo e racional, a beleza de Deus se faz presença, se visibiliza.

A beleza de Deus se difunde, se manifesta

E ao contemplar o esplendor da beleza de Deus revelada na Criação, a pessoa se sente seduzida, fascinada, se faz amorosa. A Criação nos fascina como o sol, nos atrai poderosamente e nos enche de entusiasmo. Esta experiência evoca um sentimento profundo de veneração, de encantamento, de reverência e respeito. O olhar contemplativo sobre a realidade ativa em nós o assombro, a admiração, o espanto. Diante da sacralidade da vida e do ser humano, diante das maravilhas do universo, o espanto é a única atitude condigna. As criaturas existem e são sustentadas pela força onipotente de Deus.

Ele continua trabalhando, re-criando, fazendo tudo novo. O mundo inteiro é um enorme sacramento do Amor. O universo se transforma num sacramento, num lugar e num espaço de manifestação da divina presença, todas as coisas são por excelência a revelação do sagrado. Ter fé é encarar de frente o mistério, e se encantar com ele. A fé é um encantamento e um mergulho confiante no infinito Amor de Deus, que aos poucos se manifesta a quem decide acolhê-lo com amor. E esta manifestação se realiza nas coisas simples da vida. Fé e encantamento andam sempre juntas. “É poeticamente que o ser humano habita a terra” (F. Holderlin).

Habitamos poeticamente o mundo

A cada momento, quando vemos o outro lado das coisas e outro mundo dentro do mundo de beleza e encantamento: sentimos, estremecemos, vibramos, nos enternecemos, ficamos encantados com a Criação e sua insondável vitalidade e beleza. Aqui o ser humano se descobre reconciliado com o universo que o cerca: “exclamação de admiração com intenso afeto, discorrendo por todas as criaturas” (EE 60).

A contemplação não pode ser compreendida de maneira passiva ou romântica, mas, ao contrário, ativa e interpelativa. É uma contemplação em que o belo, o fascinante e o diferente cativam os olhos, enchem a nossa interioridade de louvor e admiração. Contemplação é descobrir Deus em tudo. É sentir-se sempre em Deus. Contemplação é amar a Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus. É sentir-se amado por Deus em todas as coisas e amar a Deus em todas elas.

Texto Bíblico Hb 11,1-40 / Lc 12,22-32 / Ecl 18,1-14

 

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