De Iñigo para o santo Inácio
“Todos os dons que me destes, com gratidão vos devolvo, disponde deles Senhor, segundo a vossa vontade”.
O ano inaciano, tempo comemorativo em que celebramos os 500 anos da conversão de Santo Inácio, convida-nos para juntos rezarmos e meditarmos mais um momento da vida do Peregrino de Loyola, nosso mestre na oração. É interessante observar como Deus aproveita a maioria das características, dons e talentos já recebidos por Iñigo e os conserva em Inácio, como bem podemos observar:
Os elementos apresentados anteriormente, demonstram o começo dessa conversão, da peregrinação e transformação de Inácio. Ele mesmo nos mostra o momento, o começo dessa conversão, da peregrinação e transformação do homem. Demonstra-nos ainda como Deus só aprimora os mesmos talentos com os dons acrescidos pela ação do Espírito, para que ele se deixe afetar, afeiçoar mais e aprofundar na missão, no projeto e no modo de proceder de Jesus Cristo.
É muito significativo observar como Deus promove nele essa mudança. Desde o episódio de Inácio, na batalha de Pamplona, em que é ferido e durante a sua convalescença, Deus vai dando-lhe tempo e construindo esse novo homem.
“Véspera de Nossa Senhora de Março, do ano de 1522, de noite, foi o mais secretamente que pôde a um pobre, despiu-se de todas as suas vestes e as deu” (autobiografia, n. 18). Significativa é a troca, não só da roupa de um fidalgo com a de um peregrino, mas este ato confirma que, livremente, abraçava a pobreza. Nessa troca, aos poucos, o Pai lhe concede a graça da metanoia: mudança de mentalidade, de pensamento, de seu modo de ver, compreender e experimentar o seu novo mundo. Ele vai mudando sentimentos e principalmente objetivos futuros.
“Vestiu-se de sua desejada túnica e foi fincar-se de joelhos, diante do altar de Nossa Senhora, ora ajoelhado, ora de pé, com o bordão na mão, passou toda a noite em vigília” (autobiografia, n. 18). Na noite de 24 para 25 de março de 1522, Iñigo deposita, aos pés da Virgem, sua espada e punhal, que tanto o protegeram até então. A partir daí a dama, com quem ele sonhava casar-se é substituída. Maria, daqui para frente, será a sua Senhora. De agora em diante, ele lutará com outras armas.
“Ao amanhecer, partiu, não pelo caminho direto de Barcelona, onde acharia muitos que o conheciam e honrariam, mas desviou-se para um povoado chamado Manresa” (autobiografia, n. 18). A partir de então, numa cova nesse povoado, começou a escrever os Exercícios Espirituais, ensinando-nos um método inovador de orar, de afeiçoarmo-nos e chegarmos, pela contemplação, o mais perto possível da pessoa de Jesus Cristo.
“Indo já uma légua de Monserrate, alcançou-o um homem que vinha com pressa atrás dele e lhe perguntou se dera suas vestes a um pobre. Respondendo que sim, saltaram-lhe lágrimas nos olhos, por compaixão do pobre, compreendo que o molestavam como se as tivesse roubado” (autobiografia, n. 18). No intuito de favorecer o pobre na troca de roupa, ele, sem querer, complicou mais a vida do homem, que apanhou por acharem que estava mentindo. Contemplando essa cena, podemos explicitamente ver na reação de Iñigo, a misericórdia, a tristeza e certa culpa por, sem querer, ter prejudicado a vida daquele homem. Vestido de mendigo, cai na conta da crueldade da justiça humana, que penaliza um pobre vestido de rico, dando mais valor à aparência do que à essência.
Percebemos que assumindo a indiferença inaciana, ele entrega a Deus tudo que é e tem. Foi intuindo e discernindo, guiado pelo Espírito, o que Deus dele esperava. Que possamos como Inácio entregar e fazer uso de nossos dons e talentos, para o bem maior e mais universal.
Texto bíblico: Mt 25, 14-29